(Revista Pergunte e Responderemos, PR 320/1989)
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Chamamos "cristãos" o conjunto de pessoas que no mundo acreditam
Quem considera o panorama do Cristianismo no mundo, verifica que nele há diversas denominações: a Católica, as Protestantes, as Ortodoxas... Daí a necessidade de procurarmos compreender essa variedade, que está ligada a fatos históricos.
1. Igreja Católica
Jesus Cristo fundou a sua Igreja, e confiou-a a Pedro e seus sucessores, como narram os Evangelhos:
Mt 16,17-19: "Jesus disse a Pedro: Bem-aventurado és tu, Simão, filho de João, porque não foi carne ou sangue que te revelou isso, e sim o meu Pai, que está nos céus.
Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno nunca prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus e o que ligares na terra será ligado nos céus, e o que desligares na terra, será desligado nos céus".
Lc 22,31s: "Disse Jesus a Pedro: Simão, Simão, eis que Satanás pediu insistentemente para vos peneirar como trigo; eu, porém, rezei por ti a fim de que a tua fé não desfaleça. E tu, voltando-te, confirma teus irmãos".
Jo 21,15-17: "Disse Jesus a Pedro: Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes? Ele lhe respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo Jesus lhe disse: Apascenta os meus cordeiros : Uma segunda vez lhe disse: 'Simão, filho de João, tu me amas? - Sim, Senhor, disse ele, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Apascenta as minhas ovelhas : Pela terceira vez disse-lhe: Simão, filho de João, tu me amas? Pedro respondeu...: Tu sabes tudo; tu sabes que te amo. Jesus lhe disse: Apascenta as minhas ovelhas".
A Igreja, que deve durar até o fim dos tempos, precisará sempre do fundamento visível instituído por Cristo; este fundamento são os Papas, os sucessores de São Pedro e Bispos de Roma (pois Pedro morreu em Roma como Bispo da comunidade local).
A Igreja fundada por Jesus se chama:
a) Católica, porque é universal ou destinada a todos os homens, como já anunciavam os Profetas (Is 2,2-5; 56, 6-8) e São Paulo confirmou (CI 3,11; GI 3,27s; 1Cor 12,13). A palavra "católica" vem do grego kath'holon, que significa "por toda parte" (universal).
b) Apostólica. A Igreja de Cristo é apostólica não só porque exerce o apostolado ou a missão no mundo, mas também porque a mensagem de Cristo passa necessariamente pelos Apóstolos; são estes que representam as doze tribos de Israel (cf. Mt 19,28) e se tornaram pilastras da Igreja (cf. Ap 21,14).
c) Romana, porque o Chefe visível da Igreja de Cristo é o Bispo de Roma (= o Papa). O título romana não significa nacionalismo ou particularismo, pois a Igreja não tem nacionalidade, mas precisa de uma sede central localizada em algum ponto da terra. Assim também Jesus era o Salvador de todos, mas tomou o título de Nazareno (= Jesus de Nazaré), porque ele precisava de ter uma residência ou uma localização na terra.
A Igreja fundada por Cristo e entregue ao pastoreio dos Apóstolos e seus sucessores desenvolveu-se através dos séculos. Em nossos dias, conta cerca de 907 milhões de fiéis, espalhados por todo o mundo.
No decorrer dos tempos, separaram-se alguns blocos do tronco central da Igreja.
Vejamos quais são.
2. Monofisitas e Nestorianos
No século V os teólogos procuraram exprimir em fórmulas precisas o mistério da Encarnação do Filho de Deus.
Houve então uma corrente dita Nestoriana (porque encabeçada por Nestório, patriarca de Constantinopla desde 428); afirmava que em Jesus havia dois Eu ou duas pessoas: uma divina, com a sua natureza divina, e outra, humana, com a sua natureza humana. Esta doutrina foi rejeitada pelo Concílio de Éfeso em 431, pois não ressalvava devidamente a noção de Encarnação. Todavia muitos seguidores de Nestório não aceitaram a decisão do Concílio e separaram-se da Igreja, formando o bloco nestoriano. Espalharam-se até a China e a Índia, mas em nossos dias estão reduzidos a pequeno número, pois nos últimos quatro séculos a maioria voltou à comunhão católica.
Pouco depois, uma corrente de teólogos propôs doutrina contrária à de Nestório: em Jesus haveria um só Eu e uma só natureza (a divina), pois a humanidade teria sido absorvida pela Divindade. Eram os chamados "Monofisitas", chefiados por Dióscoro de Alexandria. A sua tese foi rejeitada pelo Concílio de Calcedônia em 451, que afirmou haver em Jesus uma só Pessoa (Divina) ou um só Eu e duas naturezas (a divina e a humana). Muitos monofisitas não aceitaram a definição de Calcedônia e separaram-se da Igreja Católica; - são hoje cerca de cinco milhões no Egito, na Etiópia, na Síria e na Armênia; já não professam a doutrina de Dióscoro, de modo que a sua volta à comunhão católica está facilitada.
3. Os Ortodoxos orientais
No decorrer dos séculos os cristãos do Oriente e os do Ocidente foram sendo caracterizados por culturas diferentes: a grega no Oriente, cuja capital era Bizâncio ou Constantinopla (= Istambul na Turquia de hoje); e a latina no Ocidente, cuja capital era Roma. Falavam uns o grego, outros o latim; os costumes litúrgicos e a disciplina iam-se diferenciando aos poucos. Ora isto causou mal-entendidos e rivalidades entre cristãos bizantinos e cristãos latinos. Finalmente essas divergências deram ocasião a um cisma ou uma ruptura em 1054, por obra do Patriarca Miguel Cerulário de Constantinopla. Por motivos teológicos secundários, os cristãos de Bizâncio separaram-se de Roma, e, com eles, outros orientais (rumenos, búlgaros, russos, etc.). Constituem hoje um bloco de cerca de 173 milhões de fiéis. Chamam-se "ortodoxos", porque na época das
Houve tentativas de reunião dos ortodoxos com os católicos através dos séculos, principalmente por ocasião dos Concílios de Lião 11 (1274) e Florença (1438-45).
Todavia os resultados positivos foram de curta duração. Em nossos dias, há grande aproximação entre Roma e Constantinopla, pois na verdade são poucas as diferenças doutrinárias que separam do Catolicismo os ortodoxos orientais.
4. Protestantismo
No século XVI Martinho Lutero, a partir de 1517, resolveu reformar a Igreja, que passava por uma fase difícil: a teologia não alimentava a piedade dos fiéis, que era exuberante, mas mal orientada; além disto, o Renascimento ou o interesse pelas artes e a cultura antigas, desentulhadas nos arquivos e bibliotecas, fazia que o clero se deixasse penetrar por espírito mundano.
Lutero, levando em conta esta situação e atendendo a um problema pessoal, proclamou que a fé sem as obras boas nos faz amigos de Deus; tencionava assim interpretar São Paulo, rejeitando a epístola de S. Tiago... Além disto, recusou a Tradição oral, ficando só com a Bíblia. Lutero apregoava o "livre exame" da Bíblia, isto é, queria que cada crente lesse a Bíblia sem levar em conta alguma orientação ou o magistério da Igreja; cada qual poderia interpretar a Bíblia segundo o que a sua consciência lhe dissesse. A ruptura com a Igreja deu-se definitivamente em 1521 na Alemanha.
O exemplo de Lutero foi seguido por João Calvino, de Genebra (Suíça), que proclamou doutrinas semelhantes às de Lutero.
As proposições desses reformadores se espalharam rapidamente pelo centro e o Norte da Europa. Dentro de cada denominação foram surgindo novas e novas "reformas". Isto era lógico, pois, o que Lutero tinha feito com a Igreja Católica, cada crente poderia fazê-lo em relação à sua comunidade; o princípio do "livre exame" colocava (e coloca) o crente acima de qualquer magistério, de modo que, se alguém discorda do que a sua comunidade ensina, pode separar-se dela e fundar outra "igreja".
O bloco protestante hoje compreende 322 milhões de crentes aproximadamente.
5. Anglicanismo
Na Inglaterra reinou Henrique VIII de
6. Os "Velhos-Católicos"
Em 1870 o Concílio do Vaticano I proclamou a infalibilidade do Papa quando define proposições de fé ou de Moral. Esta definição do Concílio, que não era mais do que a expressão de quanto já se acreditava e vivia na Igreja, não foi aceita pelo sacerdote Inácio Disllinger de Munique (Alemanha). Isto o levou a sair da Igreja Católica juntamente com alguns adeptos para fundar o ramo dos "Velhos-Católicos" (1872). Em 1889, estes se uniram aos Jansenistas, pequeno grupo de Cristãos que se haviam separado da Igreja em 1723 e viviam na Holanda; formaram assim a "União de Utrecht", que conta aproximadamente 100.000 fiéis.
7. Conclusão: A Igreja de Cristo
A quem pergunte agora qual é o conceito de Igreja de Cristo diante deste conjunto de denominações cristãs, respondemos: a Igreja de Cristo compreende. todas essas denominações, porque cada uma delas possui elementos da Igreja (a Bíblia, a Tradição, alguns Sacramentos, a prática da oração, o martírio...). Mas a Igreja de Cristo só subsiste plenamente na Igreja Católica Apostólica Romana, governada pelo Papa e os Bispos em comunhão com ele, pois somente nesta se encontram todos os elementos que, por instituição divina, devem integrar a Igreja; ver Constituição Lumen Gentium n° 8; Decreto Unitatis Redintegratio n° 4, do Concílio do Vaticano II. As denominações não católicas estão em comunhão imperfeita ou incompleta com a Igreja de Cristo. Todos os cristãos devem esforçar-se para que tal comunhão se torne completa mediante a oração e a fidelidade de cada um à sua vocação; o Espírito Santo fará que descubram o
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NOTA:
[1] Os números aqui publicados são fornecidos pelo Conselho Mundial das Igrejas e referem-se ao ano de 1987.