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domingo, 5 de julho de 2009

O falso mito de que os cientistas não acreditam em Deus

Por Jorge Pimentel Cintra
(www.quadrante.com.br)


O falso mito de que os cientistas não acreditam em Deus tem, na verdade, pretensões maiores do que parece à primeira vista: quer dar a entender que todas as pessoas verdadeiramente inteligentes e esclarecidas não aderem às “fábulas” ou aos “mitos” religiosos; e os cientistas, esses “homens geniais”, levados pelas demonstrações da sua ciência, chegaram à conclusão inevitável de que Deus simplesmente não existe.

Outro falso mito que “corre solto” é que os cientistas não acreditam em Deus. Em si, o fato não teria nada de mais, já que encontramos ateus de todas as profissões e de todas as categorias sociais. Este mito tem, na verdade, pretensões maiores do que parece à primeira vista: quer dar a entender que todas as pessoas verdadeiramente inteligentes e esclarecidas não aderem às “fábulas” ou aos “mitos” religiosos; e os cientistas, esses “homens geniais”, levados pelas demonstrações da sua ciência, chegaram à conclusão inevitável de que Deus simplesmente não existe.

Nada mais distante da verdade; um conhecimento superficial da vida de alguns cientistas poderia dar uma impressão desse tipo, mas um estudo mais profundo mostra sempre que os contados casos de ateísmo são muito mais uma conseqüência de circunstâncias ou de problemas pessoais do que uma atitude decorrente de conclusões científicas. De fato, até hoje ninguém apresentou nenhum argumento verdadeiramente sério sobre a inexistência de Deus, e muito menos baseado em conclusões científicas.
É um fato que houve cientistas que foram ateus ou que abandonaram a prática da religião, como por exemplo Madame Curie, polonesa de origem, nascida e educada na religião católica, que se desinteressou da religião ao ficar abalada pela morte da mãe. Só temos a dizer que é uma pena.

Por outro lado, ao longo de toda a história, poderíamos citar uma quantidade enorme de cientistas e de filósofos que acreditavam em Deus, que viveram a sua religião ou até mesmo eram pessoas de comunhão diária, como Pasteur. Muitos deles, além disso, manifestaram as suas convicções publicamente, em mais de uma oportunidade.

Descartes e Galileu morreram como bons cristãos, com todos os sacramentos; Leibniz escreveu uma obra denominada Teodicéia (“Justificação de Deus”) contra o ateísmo. Platão e Aristóteles, sobre os quais não pesa a “suspeita” de serem considerados cristãos ou católicos, já que viveram antes de Cristo, apresentaram inúmeras provas da existência de Deus, com argumentos puramente racionais. Em Newton e Kepler encontramos almas profundamente cristãs, que não tiveram o menor receio de falar de Deus nos seus escritos. Mendel, o iniciador da genética, fez as suas experiências com ervilhas nos terrenos do mosteiro de que era abade. Copérnico, reintrodutor moderno do sistema heliocêntrico, era clérigo.

Para não alongarmos demasiado o texto com explicações, apresentamos a seguir depoimentos de alguns cientistas sem acrescentar-lhes maiores comentários e restringindo-nos somente a alguns que já fazem parte da história.1
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(1) Citações extraídas do folheto Gott existiert, reproduzidos em Pergunte e Responderemos, ano XXIX, n. 316, setembro de 1988.
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1. Isaac Newton (1642-1727), fundador da física clássica e descobridor da lei da gravidade: “A maravilhosa disposição e harmonia do universo só pode ter tido origem segundo o plano de um Ser que tudo sabe e tudo pode. Isto fica sendo a minha última e mais elevada descoberta”.

2. William Herschel (1738-1822), astrônomo alemão, descobridor do planeta Urano: “Quanto mais o campo das ciências naturais se dilata, tanto mais numerosas e irrefutáveis se tornam as provas da eterna existência de uma Sabedoria criadora e todo-poderosa”.

3. Alessandro Volta (1745-1827), físico italiano, descobridor da pilha elétrica e inventor, cujo nome deu origem ao termo voltagem: “Submeti a um estudo profundo as verdades fundamentais da fé, e [...] deste modo encontrei eloqüentes testemunhos que tornam a religião acreditável a quem use apenas a sua razão”.

4. André Marie Ampère (1775-1836), físico e matemático francês, descobridor da lei fundamental da eletrodinâmica, cujo nome deu origem ao termo amperagem: “A mais persuasiva demonstração da existência de Deus depreende-se da evidente harmonia daqueles meios que asseguram a ordem do universo e pelos quais os seres vivos encontram no seu organismo tudo aquilo de que precisam para a sua subsistência, a sua reprodução e o desenvolvimento das suas virtualidades físicas e espirituais”.

5. Jons Jacob Berzelius (1779-1848), químico sueco, descobridor de inúmeros elementos químicos: “Tudo o que se relaciona com a natureza orgânica revela uma sábia finalidade e apresenta-se como produto de uma Inteligência Superior [...]. O homem [...] é levado a considerar as suas capacidades de pensar e calcular como imagem daquele Ser a quem ele deve sua existência”.

6. Karl Friedrich Gauss (1777-1855), alemão, considerado por muitos como o maior matemático de todos os tempos, também astrônomo e físico: “Quando tocar a nossa última hora, teremos a indizível alegria de ver Aquele que em nosso trabalho apenas pudemos pressentir”.

7. Agustin-Louis Cauchy (1789-1857), matemático francês, que desenvolveu o cálculo infinitesimal: “Sou um cristão, isto é, creio na divindade de Cristo como Tycho Brahe, Copérnico, Descartes, Newton, Leibniz, Pascal [...], como todos os grandes astrônomos e matemáticos da antigüidade”.

8. James Prescott Joule (1818-1889), físico britânico, estudioso do calor, do eletromagnetismo e descobridor da lei que leva o seu nome: “Nós topamos com uma grande variedade de fenômenos que [...] em linguagem inequívoca falam da sabedoria e da bendita mão dO Grande Mestre das obras”.

9. Ernest Werner von Siemens (1816-1892), engenheiro alemão, inventor da eletrotécnica e que trabalhou muito no ramo das telecomunicações: “Quanto mais fundo penetramos na harmoniosa dinâmica da natureza, tanto mais nos sentimos inspirados a uma atitude de modéstia e humildade; [...] e tanto mais se eleva a nossa admiração pela infinita Sabedoria, que penetra todas as criaturas”.

10. William Thompson Kelvin (1824-1907), físico britânico, pai da termodinâmica e descobridor de muitas outras leis da natureza: “Estamos cercados de assombrosos testemunhos de inteligência e benévolo planejamento; eles nos mostram através de toda a natureza a obra de uma vontade livre e ensinam-nos que todos os seres vivos são dependentes de um eterno Criador e Senhor”.

11. Thomas Alva Edison (1847-1931), inventor, com mais de 2.000 patentes, entre elas a da lâmpada elétrica: “Tenho [...] enorme respeito e a mais elevada admiração por todos os engenheiros, especialmente pelo maior deles: Deus!”.

12. Guglielmo Marconi (1874-1937), físico italiano, inventor do telégrafo sem fio, prêmio Nobel em 1909: “Declaro com ufania que sou homem de fé. Creio no poder da oração. Creio nisto não só como fiel cristão, mas também como cientista”.

13. John Ambrose Fleming (1849-1945), físico britânico, descobridor da válvula e do diodo: “A grande quantidade de descobertas modernas destruiu por completo o antigo materialismo. O universo apresenta-se hoje ao nosso olhar como um pensamento. Ora, o pensamento supõe a existência de um pensador”.

14. Arthur Eddington (1882-1946), físico e astrônomo britânico: “A física moderna leva-nos necessariamente a Deus”.

15. Max Plank (1858-1947), físico alemão, criador da teoria dos quanta, prêmio Nobel em 1928: “Para onde quer que se estenda o nosso olhar, em parte alguma vemos contradição entre ciências naturais e religião, antes encontramos plena convergência nos pontos decisivos. Ciências naturais e religião não se excluem mutuamente, como hoje em dia muitos pensam e receiam, mas completam-se e apelam uma para a outra. Para o crente, Deus está no começo; para o físico, Deus está no ponto de chegada de toda a sua reflexão”.

16. Albert Einstein (1879-1955), físico judeu alemão, criador da teoria da relatividade, prêmio Nobel em 1921: “Todo o profundo pesquisador da natureza deve conceber uma espécie de sentimento religioso, pois não pode admitir que seja ele o primeiro a perceber os extraordinariamente belos conjuntos de seres que contempla. No universo, incompreensível como é, manifesta-se uma inteligência superior e ilimitada. A opinião corrente de que sou ateu baseia-se num grande equívoco. Quem a quisesse depreender das minhas teorias científicas, não teria compreendido o meu pensamento”.

17. Carl Gustav Jung (1875-1961), suíço, um dos fundadores da psicanálise: “Entre todos os meus pacientes na segunda metade da vida, isto é, tendo mais de 35 anos, não houve um só cujo problema mais profundo não fosse constituído pela questão da sua atitude religiosa. Todos, em última instância, estavam doentes por terem perdido aquilo que uma religião viva sempre deu aos seus adeptos, e nenhum se curou realmente sem recobrar a atitude religiosa que lhe fosse própria”.

18. Werner von Braun (1912-1977), físico alemão radicado nos Estados Unidos e naturalizado norte-americano, especialista em foguetes e principal diretor técnico dos programas da NASA (Explorer, Saturno e Apolo), que culminaram com a chegada do homem à lua: “Não se pode de maneira nenhuma justificar a opinião, de vez em quando formulada, de que na época das viagens espaciais temos conhecimentos da natureza tais que já não precisamos de crer em Deus. Somente uma renovada fé em Deus pode provocar a mudança que salve da catástrofe o nosso mundo. Ciência e religião são, pois, irmãs, e não pólos antitéticos”. E: “Quanto mais compreendemos a complexidade da estrutura atômica, a natureza da vida ou o caminho das galáxias, tanto mais encontramos razões novas para nos assombrarmos diante dos esplendores da criação divina”.

Será mesmo que todos os cientistas são ateus?


POR QUE EXISTEM ATEUS?

Realmente, essa é uma pergunta muito boa, para a qual talvez não exista uma resposta conclusiva, pois no fundo trata-se de um mistério.

Para entender como se chegou a essa situação, é necessário regredir um pouco no tempo em busca das raizes do problema. Sempre houve materialistas e ateus, como Epicuro e Demócrito, já nos tempos áureos da filosofia grega; mas, para nos restringirmos aos tempos modernos, podemos começar novamente com Descartes. Uma das suas preocupações era precisamente a de estabelecer (como postulado) uma separação radical entre a fé e a razão humana, criando compartimentos estanques e incomunicáveis dentro de cada ser humano, o qual teria assim uma espécie de chave que poderia ser ligada e desligada: ora pensaria e agiria como cientista, utilizando-se só da razão, ora pensaria e agiria como homem religioso, valendo-se da fé. A religião seria, nesse esquema, algo puramente voluntário e sentimental, em que a razão não teria cabida.

Um dos fatores que contribuiram para dar origem a essa atitude foram as guerras de religião do século XVI, cujas conseqüências Descartes chegou a presenciar: manifestações de fanatismo as mais diversas, em que cada grupo afirmava estar na verdade e queria convencer os demais pela força. Não é de estranhar que, até entre gente equilibrada, se levantasse a tentação de dizer que os assuntos de religião são como os sentimentos: cada qual tem os seus, como tem os seus gostos e preferências pessoais; é assunto sobre o qual de nada adianta discutir: os argumentos são muito mais passionais do que racionais. Que motivos racionais pode ter um torcedor para torcer por um time de futebol?

Ora, uma vez que se afirme que todas as religiões são iguais – que dependem do gosto de cada um –, o passo seguinte é uma indiferença absoluta, que no fundo admite que nenhuma delas está na verdade e nenhuma possui valores absolutos. A conseqüência é que não vale a pena aderir a nenhuma religião oficial e muito menos praticá-la.

O passo histórico seguinte foi o deísmo, corrente nascida na Inglaterra, segundo a qual Deus não seria senão o Grande Arquiteto do Universo que, tendo construido o mundo, o teria abandonado a seguir nas mãos do homem; neste caso, caber-nos-ia viver como se Deus não existisse, e portanto, seria preciso rejeitar a existência de milagres, da Providência ou de um Evangelho revelado, negando também qualquer intervenção de Deus na história humana. Cristo seria um grande profeta e até o maior dos homens, o que, na boca dessas pessoas, equivalia a negar que fosse Deus. A religião, a união com Deus, ficaria reduzida a um vago sentimentalismo, e a moral a umas simples regras de convivência entre os homens.

A partir daí, alguns filósofos ingleses começaram a autodenominar-se livre-pensadores, querendo dizer com isso que estavam livres da superstição (isto é, da religião), e que aceitavam somente uma religião “natural”, sem dogmas nem ritos; adotaram o lema “liberdade, igualdade, fraternidade”, que seria assumido mais tarde pela Revolução francesa.

O passo seguinte na evolução dessa linha de pensamento foi, naturalmente, o agnosticismo (se é que Deus existe, não é possível conhecê-lo), ou simplesmente o ateísmo. Por essa rota caminharam os filósofos da Ilustração francesa: Condillac, Diderot, D’Alembert, que Lênin recomendava como a melhor introdução ao “ateísmo científico”.

Nessa trajetória nota-se, paralelamente à expulsão de Deus da vida e do pensamento, uma deificação do próprio homem. A atitude de Descartes atribui ao homem (à sua inteligência) qualidades que são exclusivas de Deus; Espinosa diz que o homem é parte de Deus; Kant atribui à razão humana um papel fundamental na constituição da realidade; Hegel, num panteísmo cósmico, deifica a razão humana, projetando-a como criadora de toda a realidade; e Feuerbach entroniza definitivamente o homem no lugar de Deus: “O homem é para o homem o ser supremo”, idéia plenamente aceita por Marx. Finalmente, Nietzsche, como representante de muitos outros, proclama a morte de Deus.

O triste paradoxo embutido nessa atitude é que, ao tentar divinizar o homem, acabou-se por animalizá-lo, reduzindo-o a um plano infra-humano. A conclusão era lógica: se o homem não provém de cima (de Deus), só pode provir de baixo (da matéria); se a dignidade do homem provém de estar feito à imagem e semelhança de Deus, ao suprimir-se Deus suprime-se também a sua dignidade, e o homem passa a ser qualquer outra coisa: o homem é aquilo que come (Feuerbach); é puro sexo (Freud); provém do macaco (Darwin), que provém da matéria (os defensores atuais da geração espontânea), que provém do caos. Em perfeita consonância com esses princípios, pregaram-se as filosofias da inimizade: o príncipe deve dominar pelo medo (Maquiavel), o homem é o lobo do homem (Hobbes), a guerra, a luta e a contradição constituem a essência da realidade (Hegel), o ódio é o motor da história (Marx), o inferno são os outros (Sartre), devemos aprender a odiar (Lunatcharsky). Os inimigos estão dentro do próprio homem, numa tensão entre id, ego e super-ego, nos recalques, nas tensões psíquicas, no stress e nos complexos dos mais diversos gêneros.

Estas breves pinceladas não têm a pretensão de ser uma análise histórica, mas penso que são suficientes para explicar uma série de características do atual estado da sociedade. Depois de tudo isso, não é de estranhar que alguns cientistas pudessem e possam desembocar no ateísmo.